A Reencarnação é um dos principais pilares do Espiritismo. Ao entendê-la, um mundo novo se descortina a nossa frente. O medo das penas eternas passa, a fé no futuro se firma, o consolo e bom ânimo ao saber que evoluiremos constantemente se instala.
Hoje somos a nossa melhor versão até aqui. E pouco a pouco iremos nos melhorando… à medida que os ensinos de Jesus penetrarem na terra do nosso coração, florescerem em gestos bondosos e frutificarem nas obras de caridade.
O texto de hoje foi inspirado em uma explicação presente na palestra intitulada “Jesus e Reencarnação”, proferida pela Carla Ribeiro nos canais da AEFC. Nessa oportunidade, veremos o que a ressurreição tem a ver com a reencarnação e qual a diferença entre ambas.
Ressurreição x Reencarnação
Kardec se atentou para esses termos logo no início do capítulo IV de O Evangelho Segundo o Espiritismo , intitulado “Ninguém poderá ver o reino de Deus se não nascer de novo”.
Ressurreição
Segundo explicação do Codificador, “ressurreição dá ideia de voltar à vida o corpo que já está morto”. Entretanto, sabemos ser cientificamente impossível. Seria contrário às leis da Natureza um indivíduo que estivesse realmente morto voltar à vida corpórea (A Gênese, cap. XV).
Podemos nos perguntar:
- Mas quanto às ressurreições que Jesus operou? Com Lázaro, a filha de Jairo, o filho da viúva de Naim…?
Podemos dizer que não se tratava de um feito sobrenatural, mas perfeitamente explicável pelas leis físicas e morais.
Dado o poder fluídico do qual o Mestre possuía, nada de espantoso há em que esse fluido vivificante, acionado por uma vontade forte, haja reanimado sentidos em torpor. Que haja mesmo feito o Espírito, prestes a abandonar o corpo, voltar a ele, uma vez que o laço perispirítico ainda não havia se rompido definitivamente
— A Gênese, cap. XV, item 39.
Nesses casos, o corpo espiritual ainda não havia se desligado por completo do corpo físico. Dessa forma, na realidade Jesus operara a cura, e não a ressurreição, na acepção legítima do termo (A Gênese, cap. XV).
E na Sua própria ressurreição, veremos que Jesus retorna no terceiro dia após a crucificação sob sua forma fluídica tangível, devido à capacidade de materialização do perispírito. Seu corpo físico padeceu, assim como o de todos nós padecerá. Enquanto que o retorno de Seu Espírito comprovou a imortalidade da alma para sempre!
O benfeitor Emmanuel cita o termo ressurreição diversas vezes em suas obras. Em suas passagens, diz que ressurreição é ressurgimento, recorrendo à palavra em grego “anástasis” que significa ressurgir, despertar.
Tal significado, porém, abre outra oportunidade de entendimento desta palavra ressurreição: o de passar da vida material para ressurgir na vida espiritual.
Ressurgindo na vida espiritual, nos revelaremos tal qual somos. Revelados de forma que às vezes não fazemos nem para nós mesmos. Lá, sintonizamos instantaneamente com o que estamos sentindo de maneira mais cristalina. Sendo muito mais difícil disfarçar o que se é.
Percebendo as dificuldades que nosso Espírito ainda possui, Deus nos permite retornar à experiência carnal. E é nesse ponto que a ressurreição na vida espiritual mostra a necessidade da reencarnação, em uma nova existência material. Não será necessário o retorno para carne somente quando o Espírito tornar-se puro (O Livro dos Espíritos, q. 170). Não obstante, ainda seja possível a reencarnação de Espíritos Puros em missão, como nosso Mestre Jesus.
Reencarnação
Os judeus da época de Jesus já acreditavam na reencarnação sob o nome de ressureição, sem uma noção clara sobre isso. Faltava-lhes a compreensão sobre a alma e sua ligação com o corpo (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. IV, item 4).
A Reencarnação é o retorno do Espírito para um novo corpo físico, formatado especificamente para uma jornada nova no plano material. O novo corpo físico pode ser totalmente diferente do da existência anterior.
O Mestre Jesus esclarece aos discípulos João e Tiago, sem deixar qualquer dúvida de que o corpo é passageiro, porém a alma imortal:
As árvores não renascem depois de podadas? Com respeito aos homens, o processo é diferente, mas o espírito de renovação é sempre o mesmo. O corpo é uma veste. O homem é seu dono. Toda roupagem material acaba rota, porém, o homem, que é filho de Deus, encontra sempre em seu amor os elementos necessários à mudança do vestuário. A morte do corpo é essa mudança indispensável, porque a alma caminhará sempre, através de outras experiências, até que consiga a imprescindível provisão de luz para a estrada definitiva no Reino de Deus, com toda a perfeição conquistada ao longo dos rudes caminhos
– Boa Nova, capítulo 14.
Então Jesus já revelava a pluralidade das existências. Isto é, a necessidade das sucessivas reencarnações até que o Espírito se encontre dotado de luz suficiente para “a estrada definitiva no Reino de Deus”. Ou seja, até que o Espírito se torne puro.
Emmanuel também faz o uso da palavra ressurreição no sentido de ressurgir da nossa condição inferior para um estado de espírito puro. Quando vencemos nossas limitações e alcançamos novo patamar de consciência e existência.
Assim, as reencarnações funcionam como um processo até atingir o estado de plenitude, de ressurreição eterna. Esse estado de elevação, de progresso, de ressurgimento, é o coroamento de toda uma trajetória longa necessitando nascer na carne.
Porém, apenas chegaremos à perfeição relativa com gasto de energia, com amor, com esforço, com constante serviço no bem.
Reencarnação, necessidade inicial
Enquanto não nos depuramos a ponto de alcançarmos o estágio de Espíritos Puros, necessitamos reencarnar. Para renascer no corpo material, há todo um planejamento reencarnatório, e o Espírito se aproxima do feto desde a concepção.
O impacto necessário para poder recomeçar é o Esquecimento do passado. E isto na verdade é uma dádiva, pois que facilita e permite nossos resgates. Quem somos permanece sob vaga intuição.
O véu do esquecimento nos provoca ao autoconhecimento. A partir do “descobrir-se”, buscamos aprender a lidar com nossas próprias sombras, cujas raízes estão no orgulho e egoísmo. Porém, nem sempre fazemos esse movimento de olhar para quem somos.
É nesse contexto, que estamos no mundo, vivemos no mundo, lidamos com ele, mas comumente esquecemos que não somos do mundo. Somos Espíritos eternos, imortais, cuja verdadeira vida é no plano espiritual. Estamos aqui diante de uma oportunidade sagrada para evoluir.
Reencarnação, proteção essencial
Estamos mergulhados nessa escola, hospital ou presídio chamada Terra. Podemos entender que a matéria nos limita, porém é essencial inicialmente, porque nos protege de nós mesmos. Por meio dela, conseguimos trabalhar nossas questões íntimas sem externalizá-las tanto quanto no plano espiritual. Isto é, a matéria age como tanque de contenção para os nossos impulsos.
Construímos a realidade que nos cerca de acordo com o que pensamos, sentimos e agimos. Educar o pensamento a fim de equilibrar os sentimentos nos leva a grande proposta da nova Era: a aprender a amar. Por consequência, aprender a agir na caridade.
Reencarnação, Lei de Misericórdia e Justiça Divina
Ao retornar para a Pátria espiritual não existem decretos absolutos, mas sim um mecanismo de reajuste e progresso. Vemos aí a Misericórdia Divina, que não nos condena para sempre, mas busca libertar o criminoso do crime:
167. Qual o fim objetivado com a reencarnação?
“Expiação, melhoria progressiva da humanidade. Sem isto, onde a justiça?”
— O Livro dos Espíritos.
Os Espíritos chamam atenção para mais um ponto que caracteriza a Reencarnação: a Justiça. Ela é a possibilidade, a oportunidade de reajuste. Percebemos a Justiça desse Pai amoroso nas lições de Jesus, que nos ensinou a pagar o mal com o bem. Deus “paga” nossos erros dando novas oportunidades de expiar e reparar o mal cometido.
Ao voltar à experiência material, conseguimos trabalhar mais rapidamente as questões que nos afastam da própria felicidade. A lógica é simples: existe uma Lei Natural (Divina), se dela nos afastarmos por meio de atos, pensamentos e sentimentos, nos afastaremos da felicidade.
A dor vem como último recurso para nós compreendermos e nos ajustarmos a essa Lei. O primeiro convite sempre é o caminho do amor, embora muitas vezes se mostre quase imperceptível pela nossa visão espiritual deturpada.
Assim, as oportunidades de resgate para o caminho de Jesus se mostrarão através de diferentes faces. O remédio para o doente sempre virá. Mas a melhora do doente depende de quanto o próprio ajuda na sua recuperação. Por exemplo, o quanto aceita o remédio que vem.
Reencarnação, Lei de Amor!
Através das sucessivas reencarnações, poderemos renascer em diferentes condições sociais, físicas, familiares, financeiras, etc. As experiências distintas forçarão a nos desenvolver intelectual e moralmente, pois veremos os diferentes lados da mesma moeda.
Após muito suor e lágrimas, a Lei de Deus, que está na nossa consciência, se mostrará mais clara. E, aos poucos, vamos nos tornando mais afins dessa Lei, do Deus que existe em nós na forma de amor.
Para praticar a Lei de amor tal como Deus a entende, é preciso que chegueis progressivamente a amar a todos os vossos irmãos, indistintamente.
— O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XI.
Somos todos filhos de um mesmo Pai, estamos entre irmãos, reencarnamos entre irmãos. Qual o limite da família, do próximo? Não seria a Humanidade toda?
Devemos olhar cada um que cruza o nosso caminho como um irmão, como um ser imortal assim como nós. Todos somos necessitados de luz, de evolução, a qual se dará apenas com ajuda mútua.
À medida que percebemos que nosso irmão é a ponte até Deus, através da caridade, é que conseguiremos evoluir.
A Lei de Reencarnação é Lei de Amor, de Misericórdia e Justiça Divina. Sem a reencarnação não conseguiremos entender toda a bondade e justiça de Deus.
Pergunte-se hoje para quê você veio ao mundo. Busque um propósito dentro do coração. Será que viemos aqui para fazer intrigas? Maldizer o outro? Viver na revolta?
Ou será que essa não é mais uma chance de resolver a relação com este e aquele irmão? De encontrar bondade no coração alheio? De perdoar? De sentir alegria em ajudar o outro? De se compreender melhor, de buscar se equilibrar?
A experiência reencarnatória é oportunidade sublime para fazer do mundo um campo de trabalho, onde somos convocados a edificar o Reino de Deus em nossos corações, e contribuir para a realização dele no mundo.
— Livro “As Perguntas de Jesus”, por Felipe Truccolo Mascarenhas.
Mensagem final
Hoje não só cremos,
mas pelas luzes da Doutrina Espírita sabemos
que a promessa da verdade são as luzes da imortalidade.
Teve fim o inferno e a escura morte,
que, de fato, é uma vida de outra sorte;
Não mais uma noite escura na eternidade,
mas dia de sublime claridade.
Auxilia-nos, Senhor,
no exercício dos sentimentos cristãos
a amar nosso irmão que caminha longe do bem,
pois hoje sabemos que quem sofre e quem erra,|
quem reclama e se desespera,
chegará também à perfeição,
pela Lei da Reencarnação.
— por Saulo César no 31° Congresso da FEEGO.
Acompanhe agora a íntegra da palestra que inspirou esta publicação:
Material consultado:
KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 125. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap.4 e 11 (Ninguém poderá ver o reino de Deus se não nascer de novo, item 4; Amar o próximo como a si mesmo, item 9).
______ O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 93. ed. Brasília: FEB, 2013. Parte Segunda. Do mundo dos Espíritos. Capítulo 5 (Da Pluralidade das Existências).
______ A Gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 50. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 15 (Os milagres do Evangelho), itens 37 a 40.
CALLIGARIS, Rodolfo. O Sermão da Montanha. 16a ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. 72 p. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, p. 8.
MASCARENHAS, Felipe Truccolo. As Perguntas de Jesus. 1ª ed. – Porto Alegre: Fergs, 2021. 148 p.
Palestra “Ressurreição e Reencarnação”, proferida pelo expositor Saulo Cesar, publicada no site do Espiritismo.TV, referente ao 31º Congresso da Federação Espírita de Goiás – Céu e inferno. Vídeo disponível em: https://www.espiritismo.tv/congressos-feego/ressurreicao-e-reencarnacao/
XAVIER, Francisco Cândido. Boa Nova. Pelo Espírito Humberto de Campos. 37. ed. 1. imp. –Brasília: FEB, 2013. 221 p. Cap. 14 (A lição de Nicodemos), p. 92-96.
* Colaborou para esta publicação: Ana Maria Beims Lopes.
** Imagem em destaque: William Lucord via Pexels.