Parábola dos Talentos

A parábola dos talentos trata sobre multiplicação. Multiplicar talentos é a finalidade evolutiva. Nossos talentos devem ser multiplicados em favor da vida, do bem, das pessoas.

Em palestra doutrinária na Associação Espírita Fé e Caridade, o expositor Adriano P dos Santos trouxe o tema da Parábola dos Talentos, que encontramos no Novo Testamento em Mateus, 25:14-30) e em O Evangelho Segundo o Espiritismo no capítulo XVI, “Não se pode servir a Deus e a Mamon”.

O expositor inicia citando o livro Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa:

…O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza! Só assim de repente, na horinha em que se quer, de propósito ― por coragem…
— Grande Sertão: Veredas.

A partir deste texto de Guimarães Rosa podemos perceber que a dinâmica da vida requer de nós dinamismo. Requer jogo de cintura, coragem, atitude, postura de aprendiz, entusiasmo, propósito, empatia, trabalho. Mas é preciso para isso, termos compreensão da dinâmica da vida.

Ensinamentos da Parábola dos Talentos

A parábola traz uma fala firme de Jesus, porém consoladora, que nos aponta caminhos, que estabelece um padrão de atitude espiritual perante a vida.

Havendo subido com seus discípulos ao monte das Oliveiras, dias antes de ser crucificado, disse-lhes o Mestre:

O Senhor age como um homem que, tendo de fazer longa viagem fora do seu país, chamou seus servidores e lhes entregou seus bens. Depois de dar cinco talentos a um, dois a outro e um a outro, a cada um segundo a sua capacidade, partiu imediatamente. Então, o que recebeu cinco talentos foi-se, negociou com aquele dinheiro e ganhou cinco outros. O que recebera dois ganhou, do mesmo modo, outros tantos.

Mas o que apenas recebera um, cavou um buraco na terra e aí escondeu o dinheiro de seu amo. Passado longo tempo, o amo daqueles servidores voltou e os chamou a contas. Veio o que recebera cinco talentos e lhe apresentou outros cinco, dizendo:

“Senhor, entregaste-me cinco talentos; aqui estão, além desses, mais cinco que ganhei.” — Respondeu-lhe o amo: “Servidor bom e fiel; pois que foste fiel em pouca coisa, confiar-te-ei muitas outras; compartilha da alegria do teu senhor.”
— O que recebera dois talentos apresentou-se a seu turno e lhe disse: “Senhor, entregaste-me dois talentos; aqui estão, além desses, dois outros que ganhei.”
— O amo lhe respondeu: “Bom e fiel servidor; pois que foste fiel em pouca coisa, confiar-te-ei muitas outras; compartilha da alegria do teu senhor.”
— Veio em seguida o que recebeu apenas um talento e disse: “Senhor, sei que és homem severo, que ceifas onde não semeaste e colhes de onde nada puseste; por isso, como te temia, escondi o teu talento na terra; aqui o tens: restituo o que te pertence.”
— O homem, porém, lhe respondeu: “Servidor mau e preguiçoso; se sabias que ceifo onde não semeei e que colho onde nada pus, devias pôr o meu dinheiro nas mãos dos banqueiros, a fim de que, regressando, eu retirasse com juros o que me pertence.” “Tirem-lhe, pois, o talento que está com ele e deem-no ao que tem dez talentos; porquanto, dar-se-á a todos os que já têm e esses ficarão cumulados de bens; quanto àquele que nada tem, tirar-se-lhe-á mesmo o que pareça ter; e seja esse servidor inútil lançado nas trevas exteriores, onde haverá prantos e ranger de dentes.”
— Mateus, 25:14 a 30.

Para que possamos melhor entender a Parábola dos Talentos, necessário se faz entendermos o que eram as parábolas tão utilizadas por Jesus.

Eram “simples” narrativas que continham verdades indispensáveis de serem compreendidas. Tinham como finalidade, tornar os ensinamentos mais claros, por meio de comparações entre os fatos da vida terrena e o conteúdo de ordem moral e espiritual. Objetivavam ainda, prender a atenção de todos aqueles que ouviam, de modo a auxiliar na guarda e na reprodução do ensino e evitar que, no futuro, os ensinamentos viessem a ser deturpados, seja pela ignorância ou pela má fé dos Homens.

O que eram os talentos

Também se faz importante entendermos o que eram os talentos na época de Jesus e o que os mesmos representam na Parábola.

Segundo Haroldo Dutra Dias, na sua palestra Parábola dos Talentos: Texto e Contexto, talento era uma medida de peso – um pedaço de metal precioso (prata, ouro) em forma de roda – utilizado no comércio da época. Havia o pequeno talento que pesava em torno de 30 kg e o grande talento em torno de 60 kg. Na época de Jesus usava-se o pequeno talento. Então, o talento não era uma moeda, mas um patrimônio considerável.

A palavra talento, na parábola, corresponde ao conjunto de todos os recursos (preciosidades) concedidos ao homem por Deus:

  • Recursos materiais: talentos emprestados, que vão ficar no mundo porque ao mundo pertencem. O poder, a riqueza, nosso corpo…
  • Recursos espirituais: talentos que são nossos, que seguirão conosco. Nossa inteligência, nossa cultura, nossas virtudes…

Breve exame da Parábola dos Talentos

Na parábola, podemos dizer que:

  • o senhor é Deus;
  • os servos são a Humanidade;
  • os talentos são os bens e recursos que a Providência nos outorga para serem empregados em benefício próprio e no de nossos semelhantes;
  • o tempo concedido para a sua movimentação é a existência terrena.

Em se tratando da distribuição e do recebimento dos talentos, Emmanuel, no livro Dinheiro, pela psicografia de Chico Xavier, diz que cada qual de nós recebe na herança congênita (inata) do pretérito, as possibilidades de serviço que nos caracterizam as tendências no mundo, de acordo com os méritos e necessidades que apresentemos. Os talentos de Deus são iguais para todos, não há privilegiados ou excluídos. Compete a nós a solução do problema relativo à capacidade de recebê-los, só recebemos aquilo que temos capacidade de administrar, completa Emmanuel.

No que se refere à aplicação dos talentos, vemos que a parábola trata sobre multiplicação. Multiplicar talentos é a finalidade evolutiva. Os nossos talentos devem ser multiplicados em favor da vida, do bem, das pessoas.

  • Aqueles que possuem recursos financeiros podem multiplicar o dinheiro na forma de escolas, hospitais, atividades esportivas, sem para isso deixar de usufruir do próprio dinheiro.
  • Os que têm acesso à cultura, aos livros além de aprenderem, podem ajudar outros a aprender também.
  • Temos também o talento da fé religiosa. Há pessoas que não participam de nenhum culto, mas dedicam-se a servir a Humanidade.
  • Ou ainda, o talento do poder. Seja o poder político, o do administrador, que deve ser multiplicado em benefícios para as pessoas.

Emmanuel nos traz duas importantes representações dos talentos divinos: tempo e oportunidade. Segundo ele, ninguém vive deserdado da riqueza das horas e das oportunidades para consagrar-se ao bem. E a multiplicação dos talentos (obras no bem) é favorecida por duas Leis Divinas: Lei de Sociedade e Lei de Trabalho.

Como multiplicar nossos talentos

Podemos então, como exemplo de multiplicação, usar nosso tempo para colher e sedimentar ensinamentos nobres, cultivar a fraternidade, oferecer consolo ao irmão necessitado, semear preces, sorrisos, afeto, emitir um pensamento de auxílio a um espírito necessitado ou mesmo um pensamento nobre onde haja maledicência.

Neio Lúcio, no livro Jesus no Lar, pela psicografia de Chico Xavier, traz uma fala de Jesus:

Os talentos do Pai foram concedidos aos filhos indistintamente, para que aprendam a desfrutar os dons eternos, com entendimento e harmonia. Uns possuem a inteligência, outros a reflexão; uns guardam o ouro da terra, outros o conhecimento sublime; alguns retêm a autoridade, outros a experiência; todavia, cada um procura vencer sozinho, não para disseminar o bem com todos, através do heroísmo na virtude, mas para humilhar os que seguem à retaguarda. (…) Quando a verdadeira união se fizer espontânea, entre todos os homens no caminho redentor do trabalho santificante do bem natural, então o Reino do Céu resplandecerá na Terra, à maneira da árvore divina das flores de luz e dos frutos de ouro.
— do livro Jesus no Lar, capítulo 46, A Árvore Preciosa.

Com referência a não aplicação dos talentos, percebemos na Parábola dos Talentos que o que recebeu um talento, preso ao próprio egoísmo e ao medo, resolveu enterrar o recurso que Deus o confiou. Aqui, enterrar significa viver apenas na materialidade da vida, consumindo e consumindo-se. São todas as pessoas que cuidam, guardam, conservam e retêm os pertences da vida para si mesmos.

No Livro Fonte Viva, Chico Xavier e Emmanuel nos oferecem a seguinte reflexão acerca do servo que enterrou o talento que recebeu:

Na parábola dos talentos, o servo negligente atribui ao medo a causa do insucesso em que se infelicita.
Recebera mais reduzidas possibilidades de ganho. Contara apenas com um talento e temera lutar para valorizá-lo.
Quanto aconteceu ao servidor invigilante da narrativa evangélica, há muitas pessoas que se acusam pobres de recursos para transitar no mundo como desejariam. E recolhem- se à ociosidade, alegando o medo da ação.
Medo de trabalhar.
Medo de servir.
Medo de fazer amigos.
Medo de desapontar.
Medo de sofrer.
Medo da incompreensão.
Medo da alegria.
Medo da dor.
E alcançam o fim do corpo, como sensitivas humanas, sem o mínimo esforço para enriquecer a existência.
Na vida, agarram-se ao medo da morte. Na morte, confessam o medo da vida.
E, a pretexto de serem menos favorecidos pelo destino, transformam-se, gradativamente, em campeões da inutilidade e da preguiça.
Se recebeste, pois, mais rude tarefa no mundo, não te atemorizes à frente dos outros e faze dela o teu caminho de progresso e renovação. Por mais sombria seja a estrada a que foste conduzido pelas circunstâncias, enriquece a com a luz do teu esforço no bem, porque o medo não serviu como justificativa aceitável no acerto de contas entre o servo e o Senhor.
— do livro Fonte Viva, capítulo 132, Tendo Medo.

As consequências de multiplicar ou não os talentos

A respeito das consequências da multiplicação ou da não multiplicação dos talentos, podemos observar na Parábola o seguinte:

  • “Servidor bom e fiel; pois que foste fiel em pouca coisa, confiar-te-ei muitas outras…compartilha da alegria do teu senhor”
    Quanto mais responsável for a aplicação do nosso livre-arbítrio, mais liberdade receberemos de Deus para cooperar, e, portanto, mais abertos estaremos à comunhão espiritual com Ele.
  • “Servidor mau e preguiçoso”
    Não basta não fazer o mal, é preciso fazer o bem! O servo, na Parábola, não fez o mal tomando para si o talento que recebeu do senhor, por exemplos, mas também não fez o bem, ou seja, não multiplicou em seu favor e em favor do próximo o talento recebido.
  • “Dar-se-á aos que já têm e esses ficarão acumulados de bens”
    Todo aquele que se interessa por corresponder à confiança do Senhor, receberá auxilio e proteção para que possa aumentar as virtudes que já possui.
  • “Ao que não tem, tirar-se-lhe-á até o que parece ter, e seja esse servidor inútil lançado nas trevas exteriores, onde haverá choro e ranger de dentes”
    Aquele que não se esforçar para acrescentar alguma coisa àquilo que recebe da misericórdia divina, provavelmente terá, em futuras reencarnações, momentos de sofrimentos, de modo a expiar o desleixo, a preguiça, a má vontade de que deu provas, quando se verá privado até do pouco que teve, por empréstimo.

Então, a título de conclusão gostaríamos de citar um fato da vida de Madre Tereza de Calcutá.

Conta-se que Madre Tereza, um dia após ter retirado das lixeiras de Calcutá um homem que estava na agonia da morte, deu-lhe banho e o colocou numa cama digna, para que ele ali morresse. Ele tomando-lhe das mãos, perguntou-lhe em lágrimas:

– Qual é, senhora, a sua religião?

E Madre Tereza lhe respondeu, marejada de emoção:

– A minha religião é você.

E qual é o Deus ao qual a senhora serve?

– Meu Deus é você.

Logo, transformar a nossa religiosidade em amor ao próximo é algo indizivelmente grandioso, que faz com que aprendamos a valorizar os talentos que Deus nos deu, a dignificar os talentos que vamos levar para depois da morte.

Referências:

– O Novo Testamento/tradutor Haroldo Dutra Dias; revisor Cleber Varandas de Lima. Brasília, DF: Conselho Espírita Internacional, 2010. 600p.

– KARDEC, Allan – O Evangelho Segundo o Espiritismo – IDE – 2017.

– GUIMARÃES ROSA, J. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

– EMMANUEL (Espírito). Dinheiro. [psicografado por] Francisco Cândido Xavier. Editora IDE.

– EMMANUEL (Espírito). Fonte Viva. [psicografado por] Francisco Cândido Xavier. 1º ed. 6 imp. Brasília, DF: FEB, 2013. 395p.

– LÚCIO, Neio (Espírito). Jesus no Lar – [psicografado por] Francisco Cândido Xavier.

– EMMANUEL (Espírito). Palavras de Vida Eterna. [psicografado por] Francisco Cândido Xavier. 1º ed. 38 imp.. Uberaba/MG: Editora Comunhão Espírita Craitã, 2013. 384p.

– CALLIGARIS, R. Parábolas Evangélicas: à luz do Espiritismo. 11º ed. Rio de Janeiro: FEB, 2010. 112p.

– Palestra Parábola dos Talentos: Texto e Contexto (You Tube) – Haroldo Dutra Dias;

– EMMANUEL (Espírito). Moradias de luz. [psicografado por] Francisco Cândido Xavier. Editora Cultura Espírita.

– EMMANUEL (Espírito). Reformador. [psicografado por] Francisco Cândido Xavier. Rio de Janeiro: FEB, 1954, p. 287.

Acompanhe agora o áudio da palestra que inspirou esta publicação:

*Colaborou para esta publicação: Adriano P dos Santos.
**Imagem em destaque:
Wikimedia Commons.

Compartilhe:

Outros Posts